Botticelli. Anunciação. 1481

Celebra-se todo 25 de março a Solenidade da Anunciação do Senhor. O dia em que Deus envia seu mensageiro à casa da Virgem Maria para anunciar uma boa notícia, a missão de ser Mãe do Filho de Deus. O anjo do Senhor visita a Virgem Maria de Nazaré e tal visita é um maravilhoso mistério de fé. Todos os dias quando que se recita a oração do Angelus nota-se a grandeza do mistério de Deus na vida da humanidade. Essa solenidade é sempre em dia ferial, portanto não se vê muitos fieis nas igrejas. Mas nem por isso deve passar despercebidos os elementos profundos, contidos na liturgia.

Este é o dia em que a eternidade entra no tempo ou, como afirma São Leão Magno:

 “A humildade foi assumida pela majestade, a fraqueza, pela força, a mortalidade, pela eternidade. Para saldar a dívida de nossa condição humana, a natureza impassível uniu-se à natureza passível. Deste modo, como convinha à nossa recuperação, o único mediador entre Deus e os homens, o homem Jesus Cristo, podia submeter-se à morte através de sua natureza humana e permanecer imune em sua natureza divina. Entrou, portanto, o Filho de Deus neste mundo tão pequeno, descendo do trono celeste, mas sem deixar a glória do Pai; é gerado e nasce de modo totalmente novo. De modo novo porque, sendo invisível em si mesmo, torna-se visível como nós; incompreensível, quis ser compreendido; existindo antes dos tempos, começou a existir no tempo. O Senhor do universo assume a condição de escravo, envolvendo em sombra a imensidão de sua majestade; o Deus impassível não recusou ser homem passível, o imortal submeteu-se às leis da morte”[1].

 

A perícope evangélica (Lc 1, 26-38) revela Deus que age e a Virgem Maria que acolhe seu convite. Ela é a expressão da humanidade que se mostra aberta para a realização do Mistério de Deus. Num primeiro momento a Virgem sente-se perturbada, incomodada pela saudação do anjo, mas logo quando ouve o anjo dizendo-lhe para não temer, pois és agraciada, fica como que tranquila; a aflição e o medo vão dando espaço a confiança aos desígnios de Deus.

Bento XVI comenta que a Anunciação “é um acontecimento humilde, escondido ninguém o viu, ninguém o conheceu, a não ser Maria, mas ao mesmo tempo decisivo para a história da humanidade”[2]. Assim, cada um de nós percebe que a ação de Deus acontece na simplicidade, no silêncio, sem muito alvoroço. Com esse evento da Anunciação o homem aprende aceitar a vontade de Deus, acolhe sua Palavra e se torna um colaborador, um instrumento de sua obra.

O “sim” dado por Maria, convida todo o povo servidor de nossas comunidades e paróquias a pensar no próprio sim que também deram a Deus. Faz-nos renovar o ardor missionário, a abertura às novidades dos tempos atuais com sabedoria, à do Espírito Santo. O mesmo Espírito que envolveu com sua força a Virgem Maria, agora envolve àqueles servidores dos diversos grupos paroquiais. Esse dia da Anunciação do Senhor torna significativo, importante e necessário o serviço dos batizados, pois Cristo se torna presente na história pelo sim dos filhos de Deus hoje.

Faz-se importante recordar que essa solenidade reporta-nos ao mistério da Encarnação. Com o “sim” da Virgem Maria, o filho de Deus se faz um de nós e com isso se cumpre a profecia de Isaías 7,14 “A virgem conceberá e dará à luz um filho e seu nome será Emanuel, porque Deus está conosco”. Deus quis que seu filho estivesse no meio de seu povo. Ele venho e assumiu nossa condição humana. A humanidade aprende, assim, a olhar para a Virgem com admiração, amor e gratidão, pois o seu “sim” trouxe ao mundo o Salvador. Deus, sendo o Todo Poderoso, contou com a generosidade, disponibilidade de sua criatura para que seu Filho viesse ao mundo.

Mãe e Filho deram a Deus Pai uma resposta sincera e generosa. Ela aceitou ser receptora do fruto bendito e divino e, Ele assumiu todo o pecado da humanidade. O Salmo 39 da liturgia desse dia, ilustra muito bem a resposta dos dois: “Eis que venho fazer com prazer, a vossa vontade, Senhor”. Que todos os homens de todos os tempos e lugares aprendam, com Maria e Jesus, a humildade, a disponibilidade, a gratuidade de servir com prazer e assim realizar a vontade de Deus Pai.

[1] LITURGIA DAS HORAS. v. e tomo II/2. O sacramento da nossa reconciliação. Vozes: 1995. p. 1506.
[2] BENTO XVI. Um caminho de fé antigo e sempre novo. v. IV. Molokai: 2017. p.157.

Edson Cardoso Colman é presbítero salesiano, pós-graduado em Liturgia pelo (UNISAL e Centro de Liturgia Dom Clemente Isnard).